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quinta-feira, 6 de março de 2014

A seta e o alvo

Chove. Não sei há quanto tempo eu não via chuva por mais de 20 minutos. Eu devia estar resolvendo coisas do trabalho, da faculdade, e de tudo mais que a gente tem que fazer pra viver, mas eu estou aqui olhando a chuva. Olhando e pegando um resfriado, porque sempre entra chuva pela janela do meu apartamento. Chove em mim, chove nas minhas coisas, etc. mas eu quero parar e olhar a chuva hoje. Na verdade, eu só quero parar em algum lugar. E me encontrar.

O meu pai não saiu do hospital no dia que eu esperava que saísse. Nem na próxima data que nos deram, nem na outra. Agora não sei mais quando sai. Não quer visitas, não pode falar muito, não se parece com a pessoa que entrou lá e eu ainda não sei se isso é ruim ou se é bom. O pai da minha melhor amiga de infância morreu logo assim que o meu pai foi internado. Nós nunca tínhamos passado por preocupações estranhas assim. Eu sempre resolvi os meus problemas e sinceramente, seria melhor que todos os problemas fossem comigo. O sofrimento mais bizarro do mundo é aquele que você não pode resolver, porque não é seu. Eu não posso consertar corações que eu não parti.

Tenho ficado em casa, estou sem trabalhar por um tempo. Também não sei se é bom ou ruim, posso ler e assistir filmes, mas também posso pensar na minha própria vida. Cometi um monte de erros nos últimos tempos, um bando deles, uma lista enorme. Me preocupei demais. Realizei menos.

 Em algum lugar me perdi totalmente da criatura encantadora que eu era aos dezesseis ou dezessete. No começo a gente costuma achar que pode tudo. Mas depois a gente cresce e vai tendo medo. Medo de perder as pessoas, medo de magoa-las, medo de não ser bom o suficiente. Vai guardando uma lista de tristezas, de arrependimentos, de coisas que podia ter dito e não disse. Até que um dia, passa um vento e muda todas as coisas de lugar. Aí a sua lista já não serve pra nada, parece tão pequena perto da lista de problemas que chega, e que logo vai parecer pequena quando a próxima chegar.

Vivemos sempre apegados a problemas que achamos ter, mas só percebemos a estupidez disso quando aparecem coisas que nós realmente não podemos dar um jeito. Então vem o arrependimento de não ter aproveitado o tempo de antes pra fazer alguma coisa melhor que reclamar. Eu não sei, mas parece que a vida vai ser sempre assim. Apesar de eu querer que ela seja diferente agora. Estou tentando.